quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Suplício


Ó meu costume afano
de tirar-lhe os sujos panos
da coberta vã ferida.
Meus ossos são iodo
no turbo de um teu outro
em ofício de rapariga.

Ó dias e noites já idas,
não esqueças-te das minhas
oferendas mal dadas,
dos meus dízimos em centavos,
das orações que te pago
pra poderes cumpri-las.

Ó coice que me quebras,
ó foice que me verga
aos corações engavetados,
por que me pões nu
no alheismo deste u
noutro gozo apergaminhado?

Ó poros que me unem
à vagina, à um hímen,
fechando-me ao desprazer,
conquanto em minha pátria
inexiste a tal Pasárgada
deste irredutível Ser.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Pensamento Avulso II

...e assim se vai mais uma tarde desenlaçada, e eu aqui, sentado numa curvatura de uma praça desfalcada, mal cuidada (de fato, sem o patrocínio do governo, não haverá preservação), em frente à bizantina Igreja do Desterro. Há a gurizada batendo a bola (ou melhor, a pelada), totalmente desprovidas de preocupações, exceto a das ameaças de se furar a bola. Estar por chegar as horas, todas as possíveis horas: a do lanche, a da volta ao trabalho,mas principalmente a hora da mexericagem, onde as Donas sentam-se às portas, dialogam sobre quem vem e quem vai, quem fez e quem não fez, quem deu e quem deixou de dá. O canto da padaria se prende em prol dos grupinhos de conversa, do bate-papo jogado fora. Enquanto isso me sustenho no além daquela parede pintada de branco com algumas indiscretas pichações, na busca de alguma deixa do passado que enseje o encetar de algum poema. Ah, caro Nietzsche, se vivo fosse, talvez procuraria cicuta para o alívio de tuas outrora dores, pois sei que não iria aguentar a “boa” música que minha vizinha escuta todas as manhãs, começando bem cedinho, estuprando toda a sensibilidade. Assim me ponho acolá, por detrás da fome das crianças sem desjejum...

Pensamento Avulso I

Quem ainda se preocupa com a ideologia? Já experimentei fazer tal pergunta aos que residem sob a Ponte Bandeira Tribuzzi, lá onde há inúmeras palafitas que, indubitavelmente, é o resumo da índole de nossa cidade. Será que ainda há resquícios, um quê que seja de ideologia presente entre aquele grupo feminino entusiasmado às vitrinas, ou àquela roda de jovens aos cantos no escopo da mexericagem? Entristeço-me quando vejo a idolatria (desculpem-me aos fanáticos), mas o fanatismo nos faz esquecer de Si mesmo, mas isso não vem ao caso, não adquirindo repercussão, pois foi alguma ojeriza passageira deste meu céu em fosso. As ideologias das pessoas (voltando ao assunto) estão sendo sufocadas, na maior parte, pela necessidade, sempre havendo pseudo-emoção quando há bondades fugazes que, em época de campanha política intumesce a muitos, desvanecendo-se a ideologia no ataúde do estômago, no recanto dos famintos, na momentaneidade que engana e viabiliza a bestialização que já vem sendo consubstanciada pela mídia, pelos programas de entretenimentos eólicos, desprovidos de qualquer conteúdo cultural, e quando falo cultural não me refiro à cultura definida pelos antropólogos, como o Keesing ou Eagleton, mas a cultura clássica, em suma, o alicerce do túmido. E o que podemos fazer? Talvez ficarmos em casa e nos derramar por sobre pensamentos, já que, se relatarmos o que andamos pensando, numa roda de chope, consequentemente seremos rejeitados, isto é, não nos darão ouvido, atenção. Então, como inteligente somos (falo isso aos que ainda sonham), falemos sobre o jogo entre o Vasco e o Botafogo, falemos sobre o último show ocorrido ou sobre a micareta que irá ocorrer. Assim não seremos excluídos das rodas, tampouco da “sociedade”...



sábado, 18 de setembro de 2010

Ninharias (trechos)


Meu espectro vaga as ruas
desta São Luís errante,
sob os sóis e suas bundas
lá ao norte do mirante.

Sol-posto em manhã de usuras,
rédeas em meu posto-ser,
embora sou-me às suas
o que em mim há de te ser.

Aflijo-me, após caio
em assoalhos de vento,
volto, após parto
no meu parto de feto.

Valho o ser sem valor,
seu sífilis, suas chagas,
suas velhas cosas sou,
cosas suas velhas pardas.

As pragas que te empesta
a púbis, é o teu estar,
roendo o osso que resta
ao teu resto tapar,

tua vácua presença humana,
as vozes do teu haver,
as tetas de tua mama
e o teu maldito por quê.

Rogo um além qualquer
no púlpito do santo-cacareco
e peço-lhe fezes-fé,
um adeus que me não meço.

E enquanto à noite venho,
cá dentro deste eterno ser
que não possas onde lenho
se fazer qualquer por quê.

Mas em Ti não há teu Ser,
nem o Ser que em Ti há,
foi-te incrédulo ao crer
no ignoto sonho ao mar.

A mim, desfeito em pó,
não cabe o ser-te os sois,
sob este sol de rococó
nos poréns de teus depois.

Sorris-te assim de quê?
Ai de ti, ser do além!
Vejo-o, todo a mercê,
dentre o Kyrie e o amém.

Durmo no seio que me nutre
de lembranças não havidas,
no haver-me carniça em abutre
que se enchem às vísceras minhas.

De gadanho um pseudo me lavra,
posto que não me entranho
qual me entranha a verme larva,
não sozinha, aos bandos,

entupindo-me em dissabores,
às avessas se alimentando
da minha carne em sabores
góticos em pitada de antanho.

Quantas partes me amputaram?
Tiram-me a mais-valia
deste cerco de arame farpado
a rasgar-me tantas tripas,

a molharem este século
de nódoas futurísticas
do insalubre que me servo
rente a poça logarítmica,

neste bicho que me estou
guardado só por estar,
perto ao baço que me vou
junto às merdas soçobrar...

Migalhas de pão (trechos)

Por isso não me constituo partes,
afundai-me em teus cadáveres,
num lodaçal dos teus buchos,
onde me pesam as pupilas
por teu ósseo lambida
neste ir que me empuxo.

Encolhido em vísceras,
em cancros hereditários deste meio,
fazem-me ações empíricas
no espinhaço dos meus ermos.
Sem ouvir Érato, a lírica,
sonho nestes bancos do Desterro,

a fugir dos enterros, vergado,
olho meu corpo defumado
por estas terras que acabrunho
uns poucos dos meus fracassos
dentre adubo um tanto imundo:
ó podridão dos meus passos,


deitado em fim cerzido
do oco que me espaço,
em teu Ser no caos do érebo
do fogo que me esgarço,
no peso do teu érbio:
verborréia em cuspe gástrico,

jorrando provisões de nada
até nada me ser de provisão,
plantando vendas fiadas
no comércio Dois irmãos,
um cético na dura estrada
descendo aos sins e aos nãos.

Há-me então no fora ou no dentro,
quando não rasgo o que foi ontem,
onde pasto e varo adentro
cubículos à hora de anteontem,
aqui, quando não venho
à revelia da planície aos montes.

O final que me principia
é o início não me tido,
posto que não me viria
adentrar o malcabido,
e cabo no que chia
às dores do corpo Cristo.

Ó papeladas em mim purulentas,
tantas chagas sem mínimos,
cheio de ti piolhenta
que me trazes ao íntimo
a placenta lamacenta
donde nasci tão ínfimo.


Ó corpo de dorso prostrado,
deitado e colhido em vão
na árvore do fruto escamado,
da fruta que sorve Adão
e faz um tão mudo pecado
no resto em migalhas de pão.

Embora desta alçada parto,
sigo uma palavra prenhe,
levo um feto em mim guardado
como o ter-te que tem-me,
e nasce o que é malogrado
de um resto de sêmen.

Varro os farelos do assoalho
a pô-los em papéis,
temperados com sal e alho
pra comer o que me és,
apesar que pouco valho
nestas brisas de marés,

nestas águas ofegantes
onde vai um quê de sonhos,
só por irem navegantes
rumo ao leste sem outono,
horas passam, passam instantes,
passa o nada que me ponho.


O sol posto perto às partes
faz-se idólatra de alguém.
Ó tudo que não é arte!
Ó tudo que não convém!
Sou-me tuas partes
e sobro o teu ninguém.

São vermes que nos comem
na fissura da maldade,
curtas e de poucos nomes,
quantos “ânus”? Tua idade?
Um século que nos consome
aos pés de podres carnes,

devorando aos orifícios,
desde a boca ao reto,
e sem tempo pelo ofício
crucifico-me: -tragam os pregos,
matam-me qual Cristo!
cospem-me aos egos...

Ser crucificado

Se porventura fizeste-me apanágio
às parcelas não pagas de um óbolo,
digo-lhe: “leve daqui mau presságio,
leve-o à pé ao socorro monólogo,
seja-te por não seres plágio
a causalidade em duos-solilóquio,
na sentença do intestino ágio,
na perca do septo em lóculo”...
...as cruzes já me fazem aborto,
no gólgota Ele foi morto,
um crucificado em Jerusalém.
Pus-me o suor da minha cruz,
em carne, veio-me à boca o pus,
impedindo-me do dizer amém.

Ser-me todavia

Conquanto ser-me-ia aquilo que queria,
ainda não irei por me ser de cor cinzenta,
posto que, de fato, não sou Mais-valia,
sou-me aqui um quarto em parte macilenta,
quando não, venho a ser ulcerada ufania
e adentro quinquilharias pouco lamacentas,
em mim soterro  o reto à tudo que desvia-
me e me arranca, da vida, a placenta.
E o que me ser-me-ia em si se foi baldado
no cio da cotovia que assovia o que éramos,
feito formalmente ponto malogrado
que sutil se descansa dentro em féretro:
um, feito tudo que se pode ser parto,
outro, feito tudo que se pode ser  pérfido.